domingo, 11 de dezembro de 2011

Para quê?

"É inútil!"

Foi a primeira frase que proferiu antes mesmo do ousado gesto de abrir os olhos, ainda na cama, e já entediado, repetiu como quem confirma uma sentença: "É inútil!"; e rolando o corpo sobre a cama enquanto tentava desamarrar as pernas do cobertor apertou forte o nada entre os dedos da mão direita e decidiu que não sairia dali.

Ele não tinha ideia em qual dia da semana estava, mas, possuía a certeza de que não valeria a pena saber, era mais um dia, como qualquer outro, mais quente talvez - dezembro traz ares infernais pouco antes do natal, deve significar alguma coisa -, talvez a temperatura fosse a mesma de sempre, é inútil saber quantos graus célsius estão espalhados pelo ar, inútil!


Seria inútil levantar-se, o mundo seria o mesmo, o café amargo, quase frio da noite anterior, o pão dormido, duro, escovar os dentes cheio de pressa, arrumar o cabelo, sair, o "bom dia" do vizinho, a roupa curta da vizinha - uma pena que seja casada - os passos apressados a caminho do ponto do ônibus, o ônibus, a gente do ônibus, a mesma gente, aquela procissão de enfermos rumo à basílica do capital, a rádio evangélica, os gritos de um pastor, as moedas tilintando em frente ao cobrador, a firma, roupas e rostos uniformizados, seus pares infinitos, todos à espera do milagre no contra-cheque do fim do mês, mês sem fim!


"É inútil!" Repetiu bufando, com a mesma expressão descrente de cada dia, olhando para a mesma parede branca. Pensou naquela moça que vez por outra dormia lá, ela tinha um nome, mas ele sempre a chamava de querida. Ela nem era tão querida assim.

Por um segundo, pensou em levantar, mas ponderou, pensou no mundo - rotação /translação, causa/efeito/causa, pedra/papel/tesoura -; o sol, arrogante como sempre, invadia o quarto por cada brecha, lembrou de Gregor Samsa! "Inútil", até Kafka é inútil!

Exatamente a qualquer hora, a luz parou de lhe ferir os olhos, percebeu certa calmaria lá fora, ouvia, ao longe, o rumor de carros parando, buzinas, abrir e fechar de portões rua abaixo: a noite. 

Lembrou que por  todo o dia ninguém batera à sua porta, nenhuma chamada no celular, nem mesmo sua mãe, nem a querida - nem tão querida assim -, tivera alguém notado a sua ausência? 

"Inútil!" repetia ele, entre risos e lençóis!


domingo, 4 de dezembro de 2011

Então é Natal, e o que foi que eu fiz?

é assim, a gente abre os olhos e já é dezembro, não sei pra onde o mundo vai com tanta pressa!

e fim de ano é aquela alegria espalhada, as casas cheias de luzes coloridas, aquele pinheiro tipicamente brasileiro, o presépio com vaquinha e tudo, aquela versão de "Então é Natal" gravada pela Simone, que se Jesus imaginasse que seria feita tinha desistido de nascer, eu falo mesmo!

aquela romaria tresloucada a comprar presentes para o amigo secreto do trabalho, da escola, da faculdade, do A.A, da casa de Swing, da Igreja - tem gente que vai ganhar dois presentes -, comprando bugiganga pra enfeitar a casa, comprando cd da Simone pra piorar a vida de todos, comprando comida, entrando no limite do cheque especial, dando a alma como fiança do cartão de crédito. bem vindo, dezembro!

há mais pessoas nas ruas no natal, pessoas que não existem circulam nas ruas, uma manada de zumbis e suas sacolas cheias, são pessoas de natal, como canções de natal, bolas de natal, presentes de natal e etc. 

não gosto, não gosto mesmo! tirando a reunião familiar e seus sabores (muito mais saborosos na infância, quando ignorávamos a hipocrisia prevalecente), pouco há para aproveitar! O feriado, os feriados, dádivas do cristianismo para esta sociedade ocidental!

não tem jeito, o natal chegou, está aí, com suas liquidações de roupas, brinquedos, pacotes de viagens, e liquidando a minha paciência que já não é lá grande coisa! é natal, troquem presentes, sorrisos, injúrias, o que quiserem, mas por favor, façam a Simone calar a boca!



filís natau

domingo, 20 de novembro de 2011

no sonho

quer dançar comigo?
uma dança só, será breve!

prometo não pisar teus pés
com estes tênis velhos.

prometo não te apertar,
não te rodar.

não te falarei ao pé do ouvido,
não perguntarei teu nome.

apenas dance comigo!
uma dança só, será breve!

prometo não te aperrear
com minhas histórias velhas.

prometo não te fazer suar,
não te cansar.

apenas dance comigo
nos teus sonhos,

serei breve!



Ibicoara, Chapada Diamantina 

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Respeito é bom e eu pago bem!

Falar em paradoxos da vida moderna me soa muito estúpido, e é! A vida é o encontro dos paradoxos mais bestiais que a humanidade protagoniza! Especiezinha estranha, viu?

Lembro-me de todas as vezes que a frase insana fora repetida: "Respeite os mais velhos!". Podia ser meu pai, mãe, professora (o), qualquer um desses seres que estão mais perto de nós para impedir que sejamos apenas quem somos! Era assim que se calava Zaratustra, ainda é!

O que há de errado na frase? Tudo, ou quase tudo, ou nada! Eu é que sou chato mesmo! Respeitar os velhos? Como assim? Rejeitamos o que é velho. Aprendemos a ser assim! Não queremos nada velho. Não queremos roupas velhas, carros velhos, cães velhos, tios velhos, pais velhos!

Lembro com alguma vergonha, nenhum remorso - cato nas lembranças algo do qual me arrepender e não acho, não que não tenha feito muita merda, sempre fiz, mas o que chamamos de vida me parece tão fatídico e tão inevitável, que não me vejo apto para ter alterado a condição de nada do que já me aconteceu -, do quanto me envergonhava dos meus pais na infância, porque eles eram velhos, sempre foram velhos! Hoje, nem tanto!

Sou o último filho do segundo casamento do meu pai, o caçula, a raspa do tacho, o resto de parição. Mães e pais dos meus colegas pareciam joviais, meu pai não; já meio calvo, cabelos grisalhos, algumas vezes me perguntavam se era meu avô! Tinha vergonha! Ele era velho! Acho que foi dele que herdei a velhice, se não me engano, aos 8 ou 9 anos! Mas eu sempre me engano!

Não gostamos de coisas velhas, ao velho que retorna chamamos vintage termo e moda que me dão no saco, perdoem-me o vocabulário, melhor seria dizer nos ovos, ou culhões, de qualquer sorte, minhas mais mentirosas desculpas. Não sabemos respeitar os velhos, não podemos. Os nossos velhos, os queremos longe, em asilos, cemitérios, longe! Gente velha e seu resmungar de dores infinitas. Odiamos o velho, odiamos a velhice, não queremos envelhecer! Muitos enfiariam um abacaxi pelo reto se isso garantisse esta juventude mórbida por mais tempo!

Sempre achei que, se tivéssemos nós sido ensinados ou orientados a respeitar ao outro em seu direito, direito de ser e de pensar diferente de nós, alguma coisa poderia ser melhor! Sei, devo estar errado novamente!

Não há qualquer benevolência em respeitar, só respeitamos quem impõe para nós respeito, quem nos obriga a respeitá-la (o), quem nos paga, quem pode nos matar, quem nos provoca alguma admiração ou temor!  E não tememos o velho! Tememos o novo, admiramos o novo, é o novo que nos pode agredir, violentar, excluir, é o Novo o objeto da adoração, do respeito vulgar e devassado que aprendemos a simular!
Eu nasci velho, é a única explicação! Pedaços de paixões foram caindo pelo caminho, e velho é foda, não pode ficar abaixando pra pegar nada do chão!

O texto é grande e mal humorado, metáfora da vida? Nem é! Não há metáforas! Só perda de tempo! A quem chegou até aqui, um pequenino e virtual regalo, é velho, mas é bom: http://www.youtube.com/watch?v=4RccOeJIbXI&NR=1

Minha ambição é uma tarde em calmaria, num mundo que só aplaude a tempestade!

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

quem nunca?


Quem nunca teve vontade de viajar depois de ver um filme, de beijar na boca depois da cena final daquele filme bobo, ou de tocar guitarra depois do show daquela banda muito foda, ou ainda, dirigir um automóvel rumo a lugar algum, ouvindo velhas canções após terminar aquele livro? Quem nunca?

Quem nunca esperou um empurrãozinho para , finalmente, ser o que é? Estamos tão longe de nossos anseios mais instintivos e primários; estamos perto demais de uma fé cega que nos cega, de uma liberdade que nos livra de tanto bem. Estamos longe de nós!

Quem nunca se viu alcançado por pensamentos irregulares em momentos de muito frio, ou muito calor?, e eu nem sei como anda o tempo lá fora! É dirigindo na madrugada, enquanto a cidade finge repousar, ou quando caminho sem pressa, sem destino, que me vejo! O quanto de mim roubaram! O quanto de mim deixei que roubassem!

(Estava lendo e não aguentei, acabei correndo pra cá, pra escrever. Um empurrãozinho, como num livro, num filme, num beijo, num riff, num ímpeto só!)

E quem nunca quis sair de casa às duas da manhã e caminhar sentindo frio? Quem sabe um cigarro entre os dedos, quem sabe um nada nas mãos, ou um sorriso discreto no rosto, quem sabe o medo do outro, quem sabe apenas a noite como companheira? Quem sabe, tropeçar em mil mendigos sem perceber pena ou graça!

Às vezes, dá vontade de partir, pra longe, muito longe, até a Fraga Maia; respirar, pisar sobre meus próprios pés - rejeitando a vossa pressa -, soprar o ar na concha que faço com as mãos, sem deixar nada para trás, quero levar tudo o que sou comigo, e voltar pra casa fingindo que encontrei um sentido pra viver!


Quem nunca quis parar? Quem nunca quis seguir? Quem nunca?

sábado, 29 de outubro de 2011

Mais pro lado...

Gosto de fotografia, sempre gostei. Sempre achei curiosa a ideia do registro, a ilusão da anacronia, a captação do que não vai se repetir jamais, e a ilusão da sincronia, de, na organização das fotos, recontar uma história, das roupas, lugares, rugas, pessoas, das próprias fotos, inception, um espelho virado pra outro espelho!

Através das fotos vi meu pai de bigode, rayban e calça boca de sino.

Nunca gostei de fotografar pessoas, nunca me interessou, não lembro de pessoas que sejam reais ao serem fotografadas, estranho; parece que ao sabermos ser olhados, mirados, nos desfazemos. Ainda pior é ser registrado, fotografado. Há uma cobrança. - Você tem que sair bem na foto. Sorria! - Mas eu não quero sorrir! - Diga "xis"!

Tiro foto dos lugares que visito. Talvez seja um modo de levar os lugares comigo, um jeito de voltar lá. Por não saber pintar, nem criar, encontrar um ângulo favorável é o mais perto da arte que consigo chegar!

O perigo disso é subtrair a realidade, é ver a paisagem através de um display, e só! É não olhar, é não ver, é não estar no lugar, não aproveitar. Parece que dizer "eu estive lá" é mais importante do que ter estado lá. Parece!

Por que dessa conversa entre mim e mim mesmo? Vi uma moça fotografar um slide numa apresentação, era uma frase qualquer, dessas que usamos para "fechar com chave de ouro". Não sei se a moça leu a frase e gostou, era uma frase, podia ter sido copiada no canto de uma página do caderno, mas não; a frase se desfez, virou imagem, foi morta. A moça não deve ter gostado daquela frase.



uma imagem vale mais que meias palavras

domingo, 9 de outubro de 2011

Vida: essa eterna troca de avatares!

Vou falar disso, sim!

Enquanto no Twitter (tuinto em port. bras.) mantém-se a tradição de, na semana do dia das crianças, adotar avatares com fotos da infância, e podemos ver, assim, a maioria dos usuários em tempos remotos; no Facebook, território pseudo-sério e de campanhas infinitas e inúteis, os usuários resolveram trocar suas fotos em ângulos favoráveis por ícones de desenhos e/ou personagens do mundo infantil, uma forma de homenagear o dia das crianças e movimentar (sem tirar a bunda da cadeira) uma campanha de combate à violência contra as crianças.

Mas espera aí! Como coibir atos violentos através de uma rede social, apenas mudando sua foto de apresentação? Mimimi mimimi!!! Querem mudar fotos, nomes, datas, talentos, mudem! A internet oferece tudo isso e bem mais! Porém, problemas sérios quando se resolvem, se resolvem com medidas mais sérias que estas!

De que adianta viver na cidade se a felicidade não me acompanhar... mudar a carinha no feissibuque, se ao ver uma criança apanhando ou sendo de alguma maneira violentada nada fazemos? E não fazemos mesmo! Quem vai chamar a polícia? Quem vai abordar o pai, ou seja lá quem for, a fim de defender o guri? Quem? Ah tá! É mais fácil militar na tela do computador né? Na vida real a gente sua, escarra, fede quando não toma banho, tem remela, tem cu, na vida real a gente é praticamente humano, com toda a iniquidade que isso emprega! Na web todo mundo é do bem! Todo mundo é contra o mal!

Certa vez, vi uma mulher arrastando o filho, acho que foi a última grande emoção da minha vida; o garoto chorava e gritava "espera, mainha!"; enquanto ela o arrastava, as pernas do garoto arranhando no asfalto, ela dizia: "cala a boca, porra! Que desgraça!". Fiquei pensando: "o que esperar de um mundo onde estes são os seres superiores que o habitam?" E eu tava falando era de mim!

Troquem de avatar. É o que fazemos o tempo inteiro! Uma cara pra família, outra pra escola/faculdade, outra pro trabalho, outra pra igreja, outra pros vizinhos, outra pra pessoa de interesse, outra pra nós mesmos. Troquemos de cara, de avatar, de nome, seremos sempre facilmente reconhecidos! Somos aqueles que levantam os vidros quando um menino sujo encosta no carro, e viramos o rosto na tentativa de ignorar aquela existência!

Quem vê cara só vê cara mesmo!

(cliquem na imagem)
 e boa campanha pra vocês...