sexta-feira, 29 de junho de 2012

1, II, três...


Um, dois, três: valendo!

Nunca foi tão fácil decorar meu endereço. Quase ninguém está seguro quando deve informar onde mora. Estamos seguros sobre onde moramos (espero), mas informar é sempre estranho, sempre em falso, não pensamos o nosso endereço, apenas sabemos. Sabendo-se chegar a nossa casa, está tudo bem (espero).

É como a velha desculpa de não saber o número do próprio telefone por jamais ligar pra si mesmo (atitude sempre tão normal: não ligamos pra nós mesmos, ocupados demais em ligar para a vida e telefones alheios).

Nunca foi tão fácil decorar meu endereço, pois, o número da casa é 123. Isso mesmo: cento e vinte e três; um, dois, três. É com esta última versão que me refiro ao meu endereço quando um recepcionista, atendente ou qualquer desinteressado pergunta o número da residência: “número um, dois, três”.

Tenho poucos segundos para contemplar a surpresa lúdica no olhar do outro. Se tivesse que apostar em qual o pensamento imediato do meu interlocutor, apostaria num: “que coincidência! Um, dois, três!”
Há quem diga que os números impõem uma interferência mística em nossas vidas, há quem mude de nome, quiçá de endereço por causa deles, estranho pensar que nós inventamos os números e não o contrário (espero). Para mim, são apenas números que, assim como a palavra “número”, serve, tão somente, pra representar uma ideia.

Certa vez, numa agência bancária, peguei a senha de número 666, nos longos minutos de espera, desejei intensamente para que a moça do caixa fosse evangélica, dia chato, sabe como é. A moça não era, não devia ser, talvez fosse, não sei. Ela sequer olhou o papel que entreguei entusiasmado, “apenas números” deve ter pensado, ela sequer me olhou, também, “apenas mais um número”, deve ter pensado.

Um, dois, três salve eu, salve todos, salve-se quem puder.

viva são timbum!!!!!!!!!!!!!!


Anarriê

Faltou o texto do São João, fiquei sem internet durante o feriado da festa, coisas da vida, coisas da Oi Velox. Mas havia a ideia sobre o que escrever e não quero deixar passar, porque idéias são cada vez mais raras.

Pra um nordestino como eu, é muito fácil disparar o clichê: “São João é a melhor festa do ano”, pode ser mesmo, se puder ser. Mas, quando você não vai a qualquer festa, não viaja e ainda fica sem internet é muito fácil esnobar a importância do santo.

Cheia de exuberâncias e injúrias, a festa é marcada por peculiaridades, a palavra “típica” é repetida ao ritmo dos estouros - a cada ano, mais altos e mais imbecis dos fogos. A bebida é típica, a comida é típica, a dança típica, a música típica (hey, essa já foi, ouvi mais pagode do que forró, neste ano: coisas da vida).

Lembro das festas de São João nos tempos de escola, havia uma missão particular: fugir da quadrilha, não importa quais desculpas inventar, não dançar quadrilha é uma conquista da infância da qual jamais esquecerei. Além de fugir da quadrilha – anarriê - olha a chuva – é mentira -, uma ambição era entender por que diabos, na mesa de comidas típicas, onde cada mãe deveria levar um prato, constavam laranjas e pipocas.

Havia canjica, bolo de milho, de aipim, amendoins, pamonhas (que dá um trabalho desgraçado pra fazer), licor não tinha, infelizmente (terceira série, pô!), e sempre: laranja e pipoca. Que esculhambação é essa? 

Pipoca é foda! Pipoca só é comida típica em junho em ano de copa do mundo. E laranja? Laranja é comida típica o ano todo. Porém em junho, ao invés de fazer suco, a povo chupa a fruta, porque sim.

Alguém pode me ajudar a desvendar o último mistério típico que me acompanha desde sempre nas festas de junho? “Anarriê” quer dizer que porra?


domingo, 10 de junho de 2012

chegada

antes mesmo de chegar à cidade, já sabia quem prestava e quem não. antes mesmo de chegar, já sabia de tudo que acontecia por aquelas partes do mundo - mundo de partes iguais - e tudo o que haveria de ocorrer. tavares já lhe havia adiantado tudo, lhe dissera onde deveria procurar um quarto, onde comer, onde beber, com quem falar, principalmente, com quem não falar e o que não falar. desculpem, tavares era o motorista do ônibus que o levara até ali. tavares: um bom sujeito, um sujeito qualquer.

uma placa verde gritava "bem-vindo". ele não entendeu. e ao descer naquele lugar foi olhado, mapeado, narrado pelas mentes silenciosas. nem sabia ele que todos também já o conheciam, sabiam a que viera, sabiam como ele seria, sabiam do seu futuro, sabiam exatamente quem ele poderia ser.

nunca soube como chegara até ali, é certo que não decidira por aquele lugar, apenas abriu os olhos e lá estava, sendo o que tinha que ser. talvez o sol estivesse a pino, ou talvez estivesse nublado, ou chovendo. não, chovendo não estava, ele sentiria, sentiria alguma coisa. de certo, pelo movimento de todos, era meio-dia, todos sentem fome à mesma hora. ele não estava com fome, ou talvez estivesse, de qualquer sorte, sabia que era a hora de comer, e todos comeriam.

enquanto comia - exatamente onde lhe disseram para comer -, olhava ao redor; tentava entender como tudo funcionava. lembrou do que tavares lhe contara a respeito de todos, todos o observavam, como deuses famintos esperando o átimo do juízo e da sentença. erguia os olhos volta e meia, todos estavam lá, a comida era horrível, a moça que lhe trouxera o prato-feito não, era uma moça como todas as moças de todas as partes do mundo - mundo de moças iguais -, por que se preocupavam dele? todos já sabiam o que seria. a comida era horrível, "que se foda", pensou, e continuou a comer.

a comanda, molhada pela lata de coca-cola, registrava R$ 12,00; era um preço muito alto por algo tão odiável, mas não tinha outro jeito e ele haveria de pagar.