quinta-feira, 8 de março de 2012

ela

Um outdoor lhe fez lembrar a comemoração deste dia, sem perceber, agradeceu ao deus no qual já não acreditava há tanto tempo por não ter checado a caixa de e-mails e ter esquecido o telefone celular em cima da mesinha no canto do quarto; há essa hora, quantas mensagens inúteis e melosas ela já teria recebido?
Reclamou do barulho das pessoas no ônibus, reclamou do barulho do ônibus.
Pensou que deveria estar feliz, talvez recebesse um buquê neste dia. Um buquê. Talvez do imbecil do chefe, ou de outro imbecil qualquer. Tentou capturar no olhar das outras algo que impusesse importância a este dia, mas encontrou apenas o próprio cansaço.
Fazia pouco caso da luta, ainda menos da história, “porra de direitos iguais!” dizia entre dentes, não que vivesse em busca de homem que lhe abrisse a porta do carro, que a levasse para jantar, pagasse a conta do motel, ajudasse a fechar o sutiã depois da foda, levantasse a tampa do vaso ou outros cavalheirismos, não sonhava em se casar, há tempos nem sonhava mais, não pensava em filhos, até tentou ter um cachorro, mas não deu muito certo: ela falava com ele, mas ele jamais lhe respondia. “Tem nada direito e só isso é igual”, bufava!
Pensava que seria indiferente caso fosse homem, estaria calor do mesmo jeito, pegaria o mesmo ônibus para o trabalho - o trabalho é sempre igual - talvez ninguém se esfregasse em seu corpo como, volta e meia, algum babaca fazia, talvez, sendo homem, fosse ela mesma a esfregar o pinto em alguma gostosa.
Pensou em ligar pra sua mãe e para a irmã a fim de dar-lhes os parabéns, faria isso assim que chegasse em casa. Lembrou do aluguel atrasado, das contas atrasadas, da vizinha velha e do seu rádio velho, “desgraçada!”.
Desceu do ônibus, entrou no escritório, foi até sua mesa, onde já lhe aguardavam um cartão e um buquê.
Cheirou as flores. Gostou. Não leu o cartão. Apenas riu e pensou: “que se foda!”